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Terça-feira, 11 de fevereiro de 2014
Invenções para fechar a conta
O regime de superávit primário foi um avanço para a gestão macroeconômica brasileira. Adotado em 1999, o sistema contribuiu para impor um princípio fundamental no trato do dinheiro público que é a responsabilidade fiscal. Foi determinante para melhorar a confiança dos investidores no país, o controle da dívida pública e a redução do risco Brasil apurado pelas agências internacionais. Esse pilar da política macro brasileira, fundamento de peso relevante para o forte crescimento econômico entre 2004 e 2008, começou a ser destruído em 2009 quando os gastos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) puderam ser excluídos da apuração do saldo fiscal. Queira ou não, essa é uma despesa pública e como tal deveria ser considerada no cálculo do resultado. A retirada dos gastos do PAC foi só o começo do que se convencionou chamar de contabilidade criativa. As manobras orçamentárias para produzir os números que o governo desejava foram pródigas mais recentemente e contemplaram medidas como a antecipação de dividendos de estatais, rubrica que envolveu triangulações entre bancos públicos e o Tesouro, e a obtenção de receitas extraordinárias, recursos que entram no caixa em um período e que não se repete depois. Além disso, as manipulações envolveram alterações de regras incialmente definidas na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), como redução da meta e a desobrigação da União em compensar a meta não alcançada por estados e municípios. Por fim, há ocorrências como o abatimento de desonerações tributárias, renegociação de dívidas tributárias e postergação de despesas. Nesse cenário marcado por mexidas casuísticas nas regras envolvendo as contas públicas, o governo acaba de anunciar o resultado primário em 2013. Divulgou que a “meta” de R$ 73 bilhões foi cumprida. O superávit de R$ 75 bilhões, que era de R$ 108 bilhões na LDO para 2013, foi alcançado graças a R$ 35,3 bilhões de receitas extraordinárias geradas pelo Refis (parcelamento de dívidas tributárias) e pelo bônus de assinatura do leilão dos campos de petróleo do pré-sal. Entraram também para os cofres da União mais R$ 15 bilhões referentes a dividendos de estatais. Contribuíram também para o saldo abatimentos de gastos do PAC e de desonerações tributárias. As “mágicas” orçamentárias do governo estão destruindo a credibilidade fiscal alcançada a duras penas. É necessário voltar a manter uma meta fiscal crível. É preferível o governo definir um superávit primário menor do que insistir em subterfúgios para alcançá-lo. A desconfiança e a incerteza elevam os riscos na economia e contribuem para adiar investimentos. A frouxidão fiscal e as invenções do governo na apresentação das contas públicas preocupam. Se a irresponsabilidade fiscal continuar dando as cartas os prejuízos serão crescentes para o país em termos de crescimento e estabilidade. ____________________________________________________________________ Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto único. É Subsecretário de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo. www.facebook.com/marcoscintraalbuquerque mcintra@marcoscintra.org www.marcoscintra.orgMarcos Cintra
Opinião Econômica
58, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, é secretário das Finanças de São Bernardo e autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
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