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Sexta-feira, 17 de junho de 2016

Continua ruim

A Receita Federal realizou um levantamento para contrapor o dado do Banco Mundial que diz que no Brasil as empresas gastam anualmente 2600 horas para calcular e pagar tributos. Segundo o fisco essa informação deixou o órgão inconformado e a entidade decidiu fazer sua própria pesquisa, em parceria com a Fenacon (Federação das Empresas de Serviços Contábeis).

Para averiguar o dado a Receita Federal diz que usou os mesmos parâmetros do Banco Mundial e chegou a 600 horas. Segundo o fisco, em um universo de 500 empresas as médias foram: 373,2 horas gastas com ICMS, IPI e contribuições, 116 horas com o IRPJ e CSLL e 97,2 horas com folha de pagamento.

De acordo com profissionais da área fiscal a diferença entre o apurado pelo Banco Mundial e a Receita Federal pode ser atribuída à informatização da estrutura fiscal brasileira nos últimos anos.

Afirmam que a nota fiscal eletrônica, o Sistema Público de Escrituração Nacional (Sped) e o e-Social geraram algum benefício em termos de desburocratização tributária, ainda que essas ferramentas apresentem falhas.

Pode até ser que o dado do Banco Mundial esteja desatualizado, mas é preciso dizer que o sistema tributário brasileiro é tão ruim, tão caótico e irracional, que qualquer medida visando alguma simplificação pode gerar algum ganho em termos de redução do tempo gasto para apurar e pagar tributos. De qualquer forma, o dado da Receita Federal revela que ainda estamos impondo um ônus absurdo ao setor produtivo por conta da burocracia tributária e isso segue comprometendo nossa capacidade competitiva.

Mesmo que o Brasil exija das empresas 600 horas para que elas possam cumprir a legislação fiscal a comparação com outros países emergentes ainda nos coloca em situação vexatória. Na África do Sul são 200 horas, China 261, Rússia 168, Índia 243, Chile 291, México 286 e Argentina 405. Os países que estariam no mesmo patamar do Brasil seriam, por exemplo, Camarões, Congo e Senegal.

Pode ser que a informatização tenha facilitado a rotina fiscal das empresas, mas essa mesma informatização é a saída para fazermos uma reforma tributária nos moldes do imposto único sobre movimentação financeira e simplificar definitivamente a vida das empresas e tirar de vez o país dessa situação incômoda que impõe elevado custo a todos os brasileiros.

Uma reforma tributária simplificadora baseada na tecnologia avançada utilizada pelo sistema bancário, vide exemplo da CPMF, associada à substituição dos tributos declaratórios, de difícil apuração e fiscalização, seria suficiente para eliminar essa aberração do tempo que as empresas gastam para lidar com os tributos. Ainda que sejam 600 horas e não 2600 horas para lidar com tributos, isso é algo inadmissível.

Estima-se que por ano o setor produtivo brasileiro gaste mais de R$ 60 bilhões apenas para cumprir as normas do fisco. Isso sem falar em outro problema gerado pelo manicômio tributário brasileiro que é o estímulo à sonegação, que apenas no ano passado ultrapassou R$ 500 bilhões. Quanto mais complexo o sistema mais fácil sonegar.

______________________________________________________________________ Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto Único.

Marcos Cintra

Marcos Cintra Opinião Econômica

58, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, é secretário das Finanças de São Bernardo e autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

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