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Quinta-feira, 12 de junho de 2008

Tributação no mundo globalizado

A informática afetou as formas como as trocas econômicas se realizam nas economias contemporâneas. A moeda manual vem sendo substituída pela moeda escritural em suas várias modalidades, como o cheque, o cartão e a moeda eletrônica. Em breve as economias modernas serão totalmente desmonetizadas.

O desaparecimento da moeda manual ocorreu precocemente no Brasil, induzido pela inflação crônica entre as décadas de 60 e meados de 90. Estimulada pela corrosão do valor da moeda manual, o país investiu no sistema bancário e na criação da moeda indexada e deixou de usar dinheiro em espécie. A economia brasileira se antecipou a uma tendência mundial e já opera com apenas 3% de taxa de monetização (papel-moeda em poder do público em relação ao PIB), uma das mais baixas entre as economias ocidentais.

Nesse cenário, cabe indagar sobre os impactos gerados na administração tributária. Qual o efeito desse fenômeno sobre os contribuintes?

As bases tributárias convencionais como a renda, o lucro e o consumo deixam de ser as formas predominantes de exação e adquirem características distintas frente ao novo cenário mundial.

As pessoas físicas com altos rendimentos passaram a ter uma mobilidade física que jamais tiveram. A territorialidade não mais define a tributação pessoal de rendas. Profissionais, artistas, esportistas, executivos e grandes empresários escolhem seus domicílios fiscais e investem seus rendimentos em países onde a tributação é menor. Tornam-se alvos voláteis e incertos para os fiscos de seus respectivos países.

No caso dos lucros a mobilidade é ainda mais acentuada. As multinacionais utilizam preços de transferências em suas relações internas e a escolha na localização de suas bases de operação passa a ser instrumentos de minimização de suas obrigações tributárias.

Quanto ao consumo, comerciantes e turistas podem adquirir produtos de elevado valor agregado em países que oferecem preços mais reduzidos. A expansão acelerada do comércio pela internet dificulta a tributação convencional, obscurecendo a identificação dos locais de origem e destino da operação.

As atuais estruturas fiscais são enfraquecidas por decisões tomadas por pessoas e empresas em diferentes partes do mundo e sobre as quais os governos possuem escassa possibilidade de controle. Tal situação leva o poder público a buscar compensação na excessiva tributação de bases menos voláteis e com menor mobilidade, como os assalariados do setor formal e os prestadores de serviços.

A base de incidência tributária que poderia se adequar aos avanços tecnológicos da globalização não está contido no lado real da economia, mas sim no lado monetário. A tributação sobre a movimentação financeira é a alternativa que permite ao fisco alcançar o maior número de contribuintes, reduzindo o ônus tributário individual.

Nesse sentido o Brasil está um passo adiante em função da experiência com a CPMF. Com a retomada da reforma tributária o país tem a oportunidade de contar com um sistema inovador se optar por substituir tributos convencionais por um imposto sobre a movimentação financeira.


Marcos Cintra

Marcos Cintra Opinião Econômica

58, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, é secretário das Finanças de São Bernardo e autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

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