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Terça-feira, 9 de dezembro de 2008

O papel estratégico dos bancos públicos

O estoque de crédito livre e direcionado no Brasil bateu recorde ao atingir R$ 1,2 trilhão em outubro deste ano, volume equivalente a 40,2% do PIB (crescimento de 1 ponto percentual em relação ao último mês de setembro e de 6,6 pontos percentuais comparativamente a outubro de 2007). O dado pode dar a impressão de que o país está passando incólume ao fenômeno de escassez mundial de crédito, mas quando é avaliado seu fluxo observa-se que a média diária entre setembro e outubro caiu 7% para as empresas e 8% para as pessoas físicas.
A comparação de outubro deste ano com o mesmo mês de 2007 mostra uma queda de 6% na média diária de empréstimo para pessoa física. Isso ocorreu muito em função do decréscimo de 58% nos recursos para financiamento de veículos e de 18% no crédito pessoal. A compensação veio com a elevação de 6% no valor das operações com cheque especial, mas o custo médio dessa linha saltou no período analisado de 139,1% ao ano para 170,8% ao ano.
No caso dos empréstimos diários para empresas houve uma elevação de 6% na comparação entre outubro de 2007 e outubro de 2008 (variação muito próxima aos índices de inflação ao consumidor acumulado em 12 meses). É importante ressaltar que nos meses de janeiro a setembro deste ano, comparativamente aos mesmos meses do ano passado, a média diária de crédito concedido vinha crescendo em torno de 16%.
As empresas tiveram em outubro deste ano, em relação ao mesmo mês de 2007, reduções nos montantes diários das operações com financiamento de bens (-59%) e nos repasses externos (-55%). Os aumentos ocorreram no capital de giro (+29%) e na conta garantida (+17%), operações cujos juros no período cresceram de 28,4% para 38,2% e de 62% para 77,1%, respectivamente.
Os dados sugerem que o fluxo total de crédito no Brasil está iniciando uma trajetória descendente para os consumidores e para as empresas e a alternativa para eles tem sido as linhas de financiamento mais caras e com tendência de aumento.
A alternativa para elevar o crédito e a reduzir se seu custo, preservando o mercado interno no país, é a ampliação da atuação dos bancos públicos na oferta de recursos. Em outubro eles aumentaram, em relação a setembro, o volume de empréstimos em 5,4%, enquanto que nas instituições privadas o crescimento foi de 1,7%. Mas, o Banco do Brasil, o BNDES e a Caixa Econômica Federal podem elevar suas participações, fazendo, com isso, papel próximo ao que o Federal Reserve vem desenvolvendo nos Estados Unidos, uma vez que a atuação do Banco Central brasileiro é mais restrita que a do FED.
Os bancos estatais devem preencher o espaço vazio deixado pelos bancos privados até que a confiança seja restabelecida e as linhas externas de crédito sejam restabelecidas. O adicional gerado pela redução dos depósitos compulsórios não está chegando aos tomadores de crédito no volume desejável e os bancos estatais poderiam utilizar esses recursos cobrando juros menores. É uma situação de emergência que seria importante para minimizar a retração da atividade e manter milhares de empregos.
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Marcos Cintra

Marcos Cintra Opinião Econômica

58, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, é secretário das Finanças de São Bernardo e autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

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