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Quarta-feira, 17 de junho de 2009
A CLT e os domésticos
O governo vai retomar a discussão a respeito da aplicação da CLT aos empregados domésticos. O tema é extremamente polêmico e a expectativa é que, caso o projeto seja aprovado, haja mais prejuízos do que benefícios para esses trabalhadores.
A proposta em estudo pretende “conceder” aos trabalhadores domésticos o “direito” à jornada de trabalho de oito horas, pagamento de hora-extra, adicional noturno, salário família, FGTS obrigatório e outros benefícios contidos na legislação trabalhista.
É “politicamente correto” aplaudir essas medidas. Afinal, dirão os progressistas mais ingênuos, por que discriminar contra os trabalhadores domésticos? Mas, infelizmente o que eles não percebem é que cada país tem suas instituições peculiares, que não devem ser autoritariamente alteradas, mas quem sabe preservadas e estimuladas, quando são funcionais e produzem bons resultados.
No tocante ao trabalho doméstico, os costumes e instituições brasileiros ao invés de serem discriminatórios contra os trabalhadores domésticos, são, pelo contrário, discriminatórios a seu favor. E as alterações em estudo no governo Lula podem acabar produzindo muito mais perdas do que ganhos para todos.
Apenas para exemplificar o risco que se corre no caso de uma regulamentação uniformizante e pasteurizada para todos os trabalhadores, inclusive os domésticos, cumpre lembrar o mal causado pelo Estatuto da Terra em 1964 no tocante aos trabalhadores rurais. O sistema de colonato, instituição secular brasileira, permitia aos trabalhadores nas fazendas fazer o cultivo intercalar nos cafezais. Ao mesmo tempo em que colhiam bons frutos de seu trabalho em benefício próprio, ainda ajudavam a manter limpas as lavouras cafeeiras, aumentando a produtividade e a rentabilidade da cultura do café no Brasil, que se tornou rapidamente o maior produtor e exportador mundial do produto. Além disso, os fazendeiros forneciam casas nas colônias para os trabalhadores, que ainda complementavam seus rendimentos com atividades de sobrevivência, como o cultivo próprio de hortas, pomares, criação de animais para auto-consumo etc.
Toda essa estrutura social e organizacional foi subitamente desmontada pelo Estatuto da Terra, que incorporou todos esses rendimentos paralelos ao salário contratual dos trabalhadores. Isto gerou conflitos e enormes passivos trabalhistas para os fazendeiros. O resultado foi um só: êxodo para as cidades, o abandono de milhões de residências rurais, o afluxo de enormes massas populacionais para as favelas nas periferias das grandes cidades, e um gigantesco déficit habitacional popular, cujo preço ainda hoje onera nossa sociedade.
Portanto, o governo deve ser extremamente cauteloso ao considerar o desmonte das instituições que foram montadas ao longo dos anos no tocante ao trabalho doméstico. Erros poderão resultar em aumento massivo de desemprego, prejudicando enormemente os milhões de trabalhadores que hoje são empregados nessas atividades. Ademais, não há sinais de rejeição ou de desconforto nessas relações.
Marcos Cintra
Opinião Econômica
58, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, é secretário das Finanças de São Bernardo e autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
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