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Quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Referência para a reforma tributária

A experiência da CPMF no Brasil foi o capítulo inicial de uma ampla revisão de conceitos na área tributária. Como afirmou Vito Tanzi, especialista em finanças públicas, a movimentação financeira é a única inovação tributária ocorrida após a introdução dos tributos sobre valor agregado em meados do século passado. De fato, mais recentemente, apenas a tributação sobre fluxos financeiros bancários pode reclamar a primazia de ser um novo paradigma.
Gerada pela revolução tecnológica da era da informação, da globalização, e da expulsão da moeda manual e sua substituição pela moeda escritural, a tributação sobre movimentação financeira acha-se em uma encruzilhada, entre o resgate e o esquecimento.
Após doze anos de aplicação, a CPMF foi extinta ao final de 2007. Foi vitimada por uma ácida luta política que inflamou o país naquele momento. O Congresso Nacional não registra em seus anais que tenha havido sequer um esboço de discussão técnica transparente e esclarecida sobre a questão. O debate pareceu mais uma disputa entre torcidas de futebol. O bebê foi jogado fora com a água do banho.
A experiência da movimentação financeira como base tributária teve início a partir da idéia do Imposto Único sobre Transações (IUT), lançada em 1990. O projeto inicial era sua implantação para substituir os tributos declaratórios, mas criou-se um imposto a mais (IPMF) a partir de 1993. Após quase vinte anos em debate, a proposta da tributação sobre movimentação financeira incorporada naquele projeto, rebatizada em 1996 como CPMF, contabiliza defensores que vão de empresários a sindicatos de trabalhadores, passando por admiradores nos meios políticos, acadêmicos e jurídicos. Isso sem citar um amplo leque de cidadãos comuns que acompanham publicações e palestras sobre o tema e que se manifestam periodicamente de modo favorável ao projeto.
Por outro lado, o tema enfrenta oposição em certos grupos do empresariado incapaz de suportar a atual carga tributária, e que vê na tributação sobre fluxos bancários apenas um artifício usado pelo governo para aumentar de forma ágil e eficaz a extração de mais impostos da sociedade brasileira. A luta contra a excessiva carga tributária foi transferida para um feroz combate à CPMF.
Tecnicamente, o tema superou a maior parte das críticas levantadas na fase inicial de sua aplicação no Brasil, tais como os riscos de desintermediação bancária, estímulo à excessiva verticalização da produção, regressividade, e dificuldades de desoneração das exportações. Perduram, contudo, críticas que apontam os males causados por sua cumulatividade, e as distorções alocativas que poderiam gerar.
Esse contingente variado de simpatizantes e de críticos reunidos ao longo dessa jornada estimulou a produção de novos estudos que deram origem a uma nova publicação de minha autoria juntamente com alguns colaboradores, lançada nos Estados Unidos, cujo título é “Bank transactions: pathway to the single tax ideal” (www.amazon.com/books).
A obra será uma referência para que a sonhada reforma tributária brasileira possa ser levada adiante em sintonia com as reais necessidades do país.

Marcos Cintra

Marcos Cintra Opinião Econômica

58, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, é secretário das Finanças de São Bernardo e autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

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