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Quarta-feira, 9 de novembro de 2011
Imposto sobre grandes fortunas e justiça fiscal
Cogita-se que o PT estaria preparando propostas de alteração de alguns impostos e que elas seriam apresentadas como uma reforma tributária do partido. Dentre as medidas constaria a regulamentação do Imposto sobre Grandes Fortunas (ISGF), previsto na Constituição Federal de 1988, como instrumento de justiça fiscal.
O debate sobre o ISGF pode voltar e com ele seriam retomadas importantes questões. A principal diz respeito à sua incidência — se sobre todo o patrimônio ou se apenas sobre os bens suntuários do contribuinte. A ideia que sempre prevalece nos projetos envolvendo esse imposto no Brasil é a gravação sobre o patrimônio, o que enseja excesso de tributação da renda e da riqueza acumulada. A renda poupada é tributada várias vezes no País. Pelo Imposto de Renda e por outros sobre o patrimônio, tais como IPTU, IPVA, ITR e os tributos sobre transmissão inter vivos e o causa mortis.
Em um país em desenvolvimento como o Brasil, a grande desvantagem do ISGF seria o desestímulo a poupança interna e o incentivo à fuga de capitais, o que por sua vez traria conseqüências negativas ao nível de investimento e ao crescimento econômico. Principalmente no quadro da globalização, no qual a tecnologia da informação empresta extraordinária mobilidade aos fluxos de capital.
Operacionalmente, o ISGF esbarra em vários pontos: a definição do sujeito passivo - se apenas pessoa física ou, também, jurídica; o estabelecimento de alíquotas - se proporcionais ou progressivas; o patrimônio a ser tributado - se na forma bruta ou líquida de dívidas; quanto à aplicação do imposto - se será universal ou comportará exceções; e sua harmonização com as garantias constitucionais de tributação não confiscatória e dos direitos de propriedade e de herança.
Não se pode abstrair, igualmente, a questão dos custos de arrecadação e administração. Nos países onde é aplicado, o ISGF tem baixa produtividade. Eis porque prevalece atualmente o entendimento geral de que esse imposto deva ser apenas um tributo auxiliar, um instrumento estatístico do Imposto de Renda na melhoria da fiscalização e da garantia de sua progressividade.
Essas limitações são reconhecidas pelos defensores do tributo, presentes nos países que o praticam. Em grande parte deles, mais por tradição do que por seus resultados arrecadatórios. Baixa produtividade e custo elevado resumem seu desempenho. Assim foi na Itália, na Irlanda e no Japão, que o abandonaram. As experiências vigentes na Espanha e na França exibem, igualmente, resultado decepcionante. Na Índia ele é desanimador.
Portanto, o ISGF como instrumento para gerar justiça fiscal é um ato inócuo, que ainda pune o sucesso. O cidadão que aumentar seu patrimônio, fruto de seu trabalho, será punido por fazê-lo.
É oportuna a tentativa do PT em tentar ressuscitar a reforma tributária, mas ela deve deixar de lado projetos ruins como o ISGF. É necessária uma ampla e profunda reformulação que torne o sistema tributário nacional mais simples e barato para o contribuinte e para o governo. Uma estrutura de impostos de natureza não-declaratória, o combate a sonegação e a gerência eficaz dos recursos deveriam ser as diretrizes desse processo.
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Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.
Marcos Cintra
Opinião Econômica
58, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, é secretário das Finanças de São Bernardo e autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
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