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Quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Conciliar é legal...sempre?

Há muito tempo a cúpula do Poder Judiciário brasileiro vem apostando em meios alternativos para solucionar conflitos, que não o processo judicial, como forma de desafogar os abarrotados tribunais. Os problemas que poderiam chegar ao judiciário podem ser resolvidos, senão pela conciliação, pela mediação. Por outro lado, em todos os casos, é possível dizer que a resolução do conflito por estes meios alternativos atinge o objetivo esperado, especialmente, salvaguardar os interesses do cidadão?
Abrem-se parênteses para ressaltar ser direito de todo cidadão levar sua reclamação ao Poder Judiciário por meio do processo judicial (nos termos da Constituição da República), não podendo ser obrigado a aceitar que a lesão ao seu direito seja resolvida de outra forma, senão por sentença judicial.
Nas últimas semanas dos últimos os anos, realiza-se a Semana Nacional de Conciliação, esta que reúne, na maioria das vezes (junto à justiça ordinária), processos apresentados contra grandes empresa de telefonia, de fornecimento de energia elétrica, bancos, empresa aéreas, planos de saúde, ou seja, em sua grande maioria, empresas que ocupam os primeiros lugares no ranking das fornecedores mais reclamadas junto aos PROCON´s do Brasil.
Tais processos, em sua grande parte, discutem ofensas causadas ao consumidor, como por exemplo, a cobrança de dívida já paga ou inexistente, o cancelamento no fornecimento de serviço sem que este tenha sido requerido pelo consumidor, a inclusão indevida do nome do consumidor junto aos cadastros de proteção do crédito (SERASA E SCPC), passageiros que são obrigados a permanecer longas horas nos aeroportos em razão de atraso no vôo,  negativa no atendimento de uma doença na qual o segurado de plano de saúde foi acometido, sem prejuízo de um incontável rol de condutas contrárias aos Código de Defesa do Consumidor.
Rotineiras são as condenações contra tais empresa  perante os Tribunais, que são obrigadas a indenizar o consumidor pelos danos proporcionados (danos materiais e/ou morais.
Pode o leitor neste instante estar fazendo o seguinte questionamento: “Ora, se estas empresas são reiteradamente condenadas em danos morais materiais, por que continuam desrespeitando a lei?”
A condenação em danos morais, de acordo com a jurisprudência, visa, além de ressarcir os danos não patrimoniais vivenciados pela vítima, proporcionar ao ofensor um sentimento de punição, a ponto de cessar tais ofensas.
Será que todo consumidor desrespeitado tem ciência dos seus reais direitos? Ou ainda, será que todo consumidor conhece os direitos e obrigações esculpidas no Código de Defesa do Consumidor? Neste momento, indispensável à figura do advogado, que diante da situação fática, identificará de forma pormenorizada todos os direitos que podem ser pleiteados judicialmente.
Pois bem, diante de tantos abusos praticados (que dão causa a inúmeras condenações judiciais), cabe a empresa alterar seus procedimentos, a ponto de impedir novas ilegalidades. Para isso, deve o fornecedor adotar medidas administrativas que geram um alto custo (contratação de novos, e aprimoramento dos funcionários existentes, compra de maquinário, etc.). Ao comparar os gastos com aprimoramento do serviço com as indenizações pagas, o empresário chega à conclusão que o pagamento de indenizações gera um custo menor (em razão das ínfimas condenações), e por isso, mantém a conduta de antes.
Diferente seria se o Poder Judiciário respeitasse a função punitiva da indenização moral, e condenasse tais empresas em valores consideráveis. Pode-se afirmar que tais condenações, em regra, não ultrapassam os R$ 10.000,00, sob o argumento de que tal valor, se por um lado deve obstar novos abusos por parte do fornecedor, não pode proporcionar o enriquecimento do consumidor. Ora, quem nos dias de hoje enriqueceria ao receber uma indenização de R$ 50.000,00 ou R$ 100.000,00?
Em conjunto com o Poder Judiciário, se o Poder Executivo, por meio das agências reguladoras (ANATEL, ANEEL, ANS, etc.) efetivamente fiscalizasse e punisse tais empresas em razão das ilegalidades praticadas (semelhante à suspensão do direito de venda de novos planos imposta a uma prestadora de serviço de acesso a internet que, punida, em menos de 30 dias despejou junto à imprensa campanha publicitária no sentido de informar aos consumidores que houve um incremento nos serviços prestados), ao certo tais desrespeitos seriam reduzidos.
Pois bem, alguém, ao processar uma grande empresa, por conta de ofensa ao CDC, ao tentar uma conciliação/mediação, foi agraciado com uma proposta de acordo satisfatória (pagamento de indenização em alto valor)?
A rotina de tais empresas, ao sentarem-se à mesa com o consumidor visando à conciliação (quando apresentam proposta de acordo), é ofertar valores ínfimos, que em nenhuma hipótese tem a capacidade de, inicialmente, indenizar o dano proporcionado, sem prejuízo de cessar a conduta ofensiva.
Ouso afirmar que a conciliação e a mediação deveriam atuar quando em cada ponta do processo, ou do conflito, existirem partes em um mesmo patamar de igualdade, especialmente no que quesito poder econômico, situação em que a negociação se dará dentro da uma equivalência de poder.
Se por um lado os mutirões de conciliação conseguem reduzir o volume de processos em tramitação, por outro, impedem que empresas que reiteradamente ofendem os consumidores sofram necessária e justa punição, mantendo assim, a permanência das práticas abusivas.
Proporcionar a resolução de conflitos por outros meios, além do Poder Judiciário, é algo que deve ser debatido seriamente perante a sociedade, contudo, ressaltando que o processo judicial é direito indiscutível do cidadão, e que tais conciliações tenham no cidadão o seu real objetivo, e não somente  na redução do número de processos, favorecendo os gestores do Poder Judiciário.
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Fábio Cenci é advogado e vice-presidente da OAB/SP, Subseção Sorocaba – e-mail: fabiocenci@cenciadvogados.adv.br

Fábio Cenci

Fábio Cenci Direito do Consumidor

Advogado especialista em Direito Bancário, pós-graduando em Direito Processual Civil e sócio do escritório Cenci Advogados. CENCI ADVOGADOS Rua Cafelândia, 344, Vila Trujillo - Sorocaba/SP - Tel/fax: (15) 3233-6741 / 3231-1805. E-mail: fabiocenci@cenciadvogados.adv.br

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