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Quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Consumidor prejudicado: quem deve indenizar?

Ofensas ao consumidor é algo que sempre ocorreu, contudo, algumas condutas passavam ilesas perante o Poder Judiciário, justamente em razão do texto de lei. Antigamente era dever do consumidor, ao sentir-se lesado por conta de uma conduta de um fornecedor do produto ou serviço, provar que o ato lesivo teve origem em conduta culposa do fornecedor (negligência, imprudência ou imperícia), sem prejuízo da identificação de quem foi o agente causador da ofensa. Tais obrigações, para o leigo, parecem lógicas, contudo, com a edição do Código de Defesa do Consumidor, “a vida do consumidor” foi muito facilitada.
Imaginemos a seguinte situação de fato: consumidor, ao retirar veículo zero quilômetro de uma concessionária, bate-o em uma árvore, sofrendo sérios danos materiais (depreciação do veículo, dias que deixou de trabalhar, etc.), estéticos (cicatrizes e deformidades) e morais. Para sagrar-se vencedor no processo judicial, deveria provar, dentre outras coisas, qual o defeito existente no veículo (que deu causa ao acidente), e mais; quem era o fabricante da peça defeituosa.
Tais requisitos, pelo completo desconhecimento do consumidor, davam causa a decisões judiciais de improcedência, retirando dele o direito de receber necessária  indenização. Como é que o consumidor poderia provar se o defeito ocorreu na “pinça de freio”, senão do “disco do freio”, ou ainda nas “pastilhas de freio”, ou se o acidente ocorreu por culpa da “barra de direção”?
 Todas as peças antes enumeradas (como a grande maioria das que compõe um veículo) são fabricadas por produtores diversos, fato este que dava causa a outra discussão no processo, qual seja; quem deveria figurar como réu no processo de indenização: a montadora do veículo ou a fornecedora da peça defeituosa (muitas vezes o consumidor sequer sabe quem produziu as peças utilizadas na linha de produção de um automóvel)?
Ocorre que com a promulgação do Código de Defesa do Consumidor (lei 8078/90), a “vida do consumidor”, ao pleitear indenização por danos proporcionados pelo fornecedor, como já dito, foi muito facilitada.
Inicialmente, não é mais dever do consumidor provar a culpa (negligência, imprudência ou imperícia) do fornecedor. Deve tão somente provar o dano sofrido, e que este se deu pelo produto ou serviço fornecido pelo fornecedor (é claro que se o dano se deu pelo uso inadequado por parte do consumidor, retira do fornecedor a obrigação de indenizar). Sobre este assunto, a lei é muito clara ao dizer ser dever do fornecedor provar que o produto ou serviço por ele fornecido não causou dano ao consumidor (a chamada inversão do ônus da provas).
Já em relação a produtos que contam com peças produzidas por mais de um fabricante, o CDC dá ao consumidor o direito de pleitear a indenização contra qualquer uma das empresas envolvidas na cadeia produtiva, ou ainda, inserir no processo todas elas.
Tome-se como exemplo um consumidor dentro de qualquer estabelecimento comercial, que ao retirar uma garrafa de vidro (cerveja, refrigerante, etc.) de uma gôndola, esta vem a explodir imotivadamente, proporcionando-lhe lesões. Antes da existência do CDC, era dever do consumidor provar no processo o porquê à garrafa explodiu, para somente após, identificar quem será inserido no processo como réu (se a culpa era do fabricante da bebida, ou do fabricante da garrafa, ou ainda do transportador).
Várias são as decisões judiciais que, ao resolver questão semelhante a ora debatida, condenaram no pagamento de indenização a própria dona da marca do produto (que muitas das vezes, limita-se a licenciar o uso da marca, e fornecimento de determinado item utilizado na cadeia produtiva, como por exemplo, o xarope utilizado na fabricação do refrigerante).
Ao certo houve inegável acerto do legislador ao determinar que qualquer das empresas envolvidas na cadeia produtiva tem o dever de indenizar os danos proporcionados ao consumidor, com exceção de prova que também deve ser por ela produzida, no sentido de que não houve dano, ou se este ocorreu, teve causa o uso indevido do produto.
Indiscutivelmente o legislador, ao criar a norma que regula as relações de consumo (Código de Defesa do Consumidor), se valeu dos ensinamentos do filósofo grego Aristóteles (tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade).
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Fábio Cenci é advogado, professor de direito processual civil e vice-presidente da OAB/SP, Subseção Sorocaba – e-mail: fabiocenci@cenciadvogados.adv.br

Fábio Cenci

Fábio Cenci Direito do Consumidor

Advogado especialista em Direito Bancário, pós-graduando em Direito Processual Civil e sócio do escritório Cenci Advogados. CENCI ADVOGADOS Rua Cafelândia, 344, Vila Trujillo - Sorocaba/SP - Tel/fax: (15) 3233-6741 / 3231-1805. E-mail: fabiocenci@cenciadvogados.adv.br

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