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Sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

O dever de reclamar do consumidor

Atualmente é muito comum que qualquer conversa seja ilustrada com “causos” de consumidores que foram desrespeitados quando da compra de um produto ou serviço. Contudo, só a reclamação entre amigos tem a capacidade de educar os fornecedores, no que diz respeito ao Código de Defesa do Consumidor, a ponto de modificar a realidade?

                                               É bom lembrar que todo cidadão, por mais simples que seja, mesmo dormindo, é considerado consumidor, afinal consome algum tipo de produto ou serviço. Durante o sono, a pessoa se utiliza do colchão, da cama, da roupa de cama, do despertador, do “criado mudo”, da porta que isola o ambiente, sem prejuízo de outros produtos que foram fabricados, senão importados, e posteriormente foram adquiridos por aquele que descansa, sendo esta relação caracterizada como de consumo, e por isso, enquadrada nos termos do CDC. Além disso, a mesma pessoa, durante o repouso, se vale da energia elétrica para utilizar o ventilador, ou ainda o ar condicionado, e ao acordar, utiliza o serviço de fornecimento de água para a higiene pessoal, serviços estes que também se encaixam nas normas da lei 8078/90.

                                               Pois bem, é indiscutível o desrespeito as normas do CDC por muitas empresas que atuam no ramo de fornecimento de produto ou serviço de massa (bancos, transporte aéreo, telefonia, internet, tv a cabo, energia elétrica, planos de saúde, dentre outras), empresas estas que, em sua maioria, são fiscalizadas pelo governo, através das agências reguladoras (ANAC, ANATEL, ANS, etc.).

                                               Ocorre que, dentre outras atribuições, cabe a tais órgãos punir aquelas empresas que não respeitam a lei, contudo, para que possam assim proceder, devem ser informadas do desrespeito praticado pelo fornecedor. Assim, sem que haja a comunicação por parte dos consumidores desrespeitados, nada poderá ser feito pele ente fiscalizador. Longe de afirmar que tais empresas primam pela fiscalização e punição daqueles que desrespeitam a lei, afinal, são órgãos vinculados ao poder executivo, e por conta disso as nomeações tem viés político e não técnico na maioria das vezes.

                                               Entretanto, quando as reclamações atingem índices alarmantes, historicamente as agências reguladoras têm atuado em favor do consumidor (afinal, o desrespeito ao consumidor é tamanho, que outra saída não resta, senão punir o faltoso). Há anos, uma fornecedora de serviço de acesso a internet teve seu direito de venda de novos planos suspenso por tempo indeterminado, até que problemas crônicos nos serviços fossem solucionados. No mesmo caminho, recentemente uma grande parcela das operadoras de telefonia móvel foram impedidas de vender novos planos, até que fossem apresentados projetos claros e objetivos, no que tange a interrupção de condutas que causavam prejuízos aos consumidores. Atualmente, várias operadoras de plano de saúde, também por desrespeitar o consumidor, foram impedidas de vender novos planos.

                                               Pois bem, para que tais empresas possam ser punidas pelas agências reguladoras, elas devem ser municiadas de dados, estes que devem ser informados pelos consumidores, por meio de reclamação elaborada junto a citados órgãos. É bem verdade que existem outros meios para que tais agências colham estes dados, como por exemplo: i) ser informada pelos Tribunais do país acerca de todas as condenações judiciais impostas em razão de ofensas aos consumidores; ii) remessa por parte dos PROCON´s, após análise, das reclamações feitas pelos consumidores.

                                               Abrem parênteses para mencionar que os fornecedores, por sua vez, se utilizam de informações colhidas junto ao Poder Judiciário para avaliar a qualidade do consumidor que pleiteia com ele firmar algum negócio. No estado de São Paulo, uma empresa que gere um cadastro de restrição ao crédito, com certa regularidade, colhe informações sobre ações judiciais propostas, como por exemplo, ações de execução, de falência, dentre outras, sendo tais dados inserido no “rol de mau pagadores”, vedando, na maioria das vezes, que algum negócio seja fechado, em razão da existência de tal processo.

                                               Assim, o consumidor tem a obrigação (e não o direito) de reclamar, primeiro para a própria empresa, após para as agências reguladoras, todas as vezes que tiver seus direitos violados, sem prejuízo ainda de consultar-se com advogado, para, se for o caso, levar tal reclamação ao poder judiciário, quando o desrespeito tenha-lhe causado algum tipo de prejuízo, mesmo que exclusivamente de cunho moral, afinal, se as reclamações permanecerem nas conversas entre amigos, o desrespeito continuará, sem qualquer tipo de punição.

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Fábio Cenci Marines é advogado, professor de direito processual civil do curso de direito da ESAMC Sorocaba: fabio@cencimarines.adv.br

Fábio Cenci

Fábio Cenci Direito do Consumidor

Advogado especialista em Direito Bancário, pós-graduando em Direito Processual Civil e sócio do escritório Cenci Advogados. CENCI ADVOGADOS Rua Cafelândia, 344, Vila Trujillo - Sorocaba/SP - Tel/fax: (15) 3233-6741 / 3231-1805. E-mail: fabiocenci@cenciadvogados.adv.br

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